sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Pais Maus


Quando meus filhos forem crescidos o suficiente para entender a lógica que motiva os pais e as mães, eu hei de dizer-lhes: Eu os amei o suficiente para ter perguntado aonde vão, com quem vão e a que horas regressarão.

Eu os amei o suficiente para não ter ficado em silêncio e fazer com que vocês soubessem que aquele novo amigo não era boa companhia.
Eu os amei o suficiente para os fazer pagar as balas que tiraram do supermercado e dizer ao dono: “Nós pegamos isto ontem e queremos pagar”.

Eu os amei o suficiente para ter ficado em pé junto de vocês, duas horas, enquanto limpavam o seu quarto, tarefa que eu teria feito em 15 minutos.

Eu os amei o suficiente para os deixar assumir a responsabilidade das suas ações, mesmo quando as penalidades eram tão duras que me partiam o coração. Mais do que tudo: Eu os amei o suficiente para dizer-lhes“não”, quando eu sabia que vocês poderiam me odiar por isso, e alguns momentos até me odiaram. Essas eram as mais difíceis batalhas de todas.

Estamos contentes, vencemos! Porque no final vocês venceram também!

E em qualquer dia, quando meus netos forem crescidos o suficiente para entender a lógica que motiva os pais e as mães; quando eles lhes perguntarem se seus pais eram maus, meus filhos vão lhes dizer: “Sim, nossos pais eram maus. Eram os pais mais malvados do mundo.”

As outras crianças comiam doces no café e nós tínhamos que comer pão, frutas e vitaminas. As outras crianças bebiam refrigerante e comiam batatas fritas e sorvete no almoço e nós tínhamos que comer arroz, feijão, carne e legumes. E eles nos obrigavam a jantar à mesa, bem diferente dos outros pais que deixavam seus filhos comerem vendo televisão.

Eles insistiam em saber onde estávamos à toda hora. Era quase uma prisão. Mamãe tinha que saber quem eram nossos amigos e o que nós fazíamos com eles. Papai insistia para que lhe disséssemos com quem iríamos sair, mesmo que demorássemos apenas uma hora ou menos.

Nós tínhamos vergonha de admitir, mas eles “violavam as leis do trabalho infantil”. Nós tínhamos que tirar a louça da mesa, arrumar nossas bagunças, esvaziar o lixo e fazer todo esse tipo de trabalho que achávamos cruel. Eu acho que eles nem dormiam à noite, pensando em coisas para nos mandar fazer. Eles insistiam sempre conosco para que disséssemos sempre a verdade e apenas a verdade. E quando éramos adolescentes, eles conseguiam até ler os nossos pensamentos.

A nossa vida era mesmo chata. Enquanto todos podiam voltar tarde da noite com 12 anos, tivemos que esperar pelos 16 para chegar um pouco mais tarde. O papai, aquele chato, levantava para saber se a festa foi boa só para ver como estávamos ao voltar.

Por causa de nossos pais, nós perdemos imensas experiências na adolescência: Nenhum de nós esteve envolvido com drogas, em roubo, em atos de vandalismo, em violação de propriedade, nem fomos presos por nenhum crime. Foi tudo por causa deles.

Agora que já somos adultos, honestos e educados, estamos fazendo de tudo para sermos “PAIS MAUS”, como os nossos foram.


Dr. Carlos Hecktheuer
Médico Psiquiatra
Passo Fundo - RS

5 comentários:

Cristiane disse...

Lindo!!

Cristiane disse...

Ufa! Cris...
Então já sei de quem é a culpa de seres assim....
Como direi... Hum...
Sei lá...
Com esse teu estilo...
hehehehe...
Fantástico!
Adoro-te linda!
Aproveito a oportunidade para endereçar parabéns a todos os pais que tiveram a coragem de serem maus, os meus incluídos!
Quanto ao artigo, está brutal! Muito bem escrito!

bjs no teu coração

Dan orthokjaer disse...

Ontem eu escrevi um comentário enorme e, na hora de publicá-lo, o blogger não funcionou. Aff, que m!
Então, o texto é lindo e traz tantos ensinamentos. Eu acho que se conhecer é tarefa das mais difíceis e exige muita coragem, paciência e sabedoria. É muito mais fácil ser superficial, sorrir sempre, deixar tudo pra lá. Mas, pra quem quer mais, isso não basta.

No texto, há frases que me tocaram muito, porque passam pela minha experiência pessoal. Muitas dessas coisas difíceis que esse gaúcho, Dr. Carlos Hecktheue cita são, pra mim, motivo de muita reflexão e um tantinho de desespero.

Achei lindo!

bassani disse...

Parece-me que todos os filhos já se revoltaram com certas atitudes dos seus pais. O meu filhote tem 4 anos e já me diz que sou chato, que estou sempre a dizer a mesma coisa... enfim, a coisa promete... No entanto, acredito que mais tarde reconhecem a intenção, independentemente de concordar com ela. Também sou pai e também sou mau... todavia tenho medo de, por momentos, me tornar, para além de um pai mau num mau pai...
boa semana
abç

Unknown disse...

Sei q errei muito, mas foi tentando acertar. Agora que aprendi um pouco de como educar e cativar um filho estou chegando ao fim mas prometo q vou aproveitar até o último minuto para que percebam que tentei ser o melhor pai do mundo.
Cris, vc é simplesmente tudo para mim, estou esperando vc voltar da viagem, temos muito oque conversar. bj